Setor Base: O artista educador e a pedagogia como legado artístico
“Ser professor é minha maior obra de arte”
Joseph Beuys*
Neste ano o Base, setor que intersecciona projetos expositivos e uma série de conversas, traz o foco para artistas que têm um comprometimento com a pedagogia e a construção de comunidade.
Convidamos para participar do setor quatro artistas, Dalton Paula, Dora Longo Bahia, Santídio Pereira e Thiago Honório, que conjuntamente às suas práticas artísticas pessoais, têm colaborado para formar, guiar, orientar e incentivar novas gerações de artistas. Tais artistas desdobraram este convite para Genor Sales, Depois do Fim da Arte, Fabrício Lopez e Julia Gallo, respectivamente, com os quais há uma relação na dimensão da pedagogia, práxis e compartilhamento de processos e experiências. Em conjunto, cada dupla apresenta aqui um projeto expositivo inédito e participa de uma conversa.
Em 2019, ao ganhar um prêmio, Dalton Paula anunciou que “o valor seria transformado em tijolo, areia, ferro e cimento para a construção de uma escola”. Tal escola, o Sertão Negro Ateliê e Escola de Artes, localizada em espaço na região norte de Goiânia, se alicerça nos fundamentos dos terreiros, subúrbios e quilombos, com o intuito de compartilhar processos criativos, conhecimentos artísticos e culturais, experiências com o meio ambiente, e saberes ancestrais. Genor Sales, artista convidado por Paula para colaborar no Base, frequenta o Sertão Negro desde seu primeiro ano de atividade, e também faz parte da associação Jatobá Nascente, projeto que visa a autonomia financeira, o desenvolvimento artístico e o comprometimento socioambiental de seis artistas. Dalton Paula e Genor Sales apresentam no Base o projeto Mirando na esperança e tecendo amanhãs e participam de uma conversa com o mesmo título mediada pela antropóloga e professora Ana Paula Ribeiro.
Dora Longo Bahia iniciou sua trajetória como professora em 1982 lecionando Educação Artística para estudantes do ensino infantil e fundamental; após um período de 12 anos atuando na escola, migrou para a universidade a convite do artista Nelson Leirner. Por quase 20 anos atuou como professora nos cursos de artes visuais da FAAP e desde 2013 é docente do Departamento de Artes Visuais da ECA/USP. Desde 2015 a artista coordena o grupo de pesquisa Depois do Fim da Arte, o qual é aberto à participação de alunos dos cursos de Artes (Audiovisual, Música, Artes Visuais, Artes Cênicas), Arquitetura, Design e Humanidades. O grupo tem como objetivo pensar o papel do artista na contemporaneidade e a relação da arte com o contexto geral- aquele no qual ela se insere e aquele do qual ela se distancia. Após 40 anos de prática docente, Longo Bahia acredita que a universidade precisa do artista, o qual leva a este repositório de conhecimento, uma reflexão sobre a prática, o fazer e as contradições da própria arte e da instituição. Depois do Fim da Arte apresentam no Base o projeto A História da Classe Trabalhadora e participam da conversa Depois do Fim, mediada pelo professor Gabriel F. Zacarias.
Santídio Pereira migrou para São Paulo quando criança e aos 8 anos e logo ingressou na escola experimental do Instituto Acaia, parte de uma entidade sem fins lucrativos fundada pela também artista Elisa Bracher. Fabrício Lopez, artista convidado por Santídio, foi seu professor no Acaia e principal tutor na técnica e história da gravura. Desta relação de ensino baseada em um trajeto afetivo, no convívio e na transmissão de energia vital por meio da prática artística, Santídio hoje articula em sua Residência Caatinga, no interior do Piauí, uma metodologia com base no afeto e no intercâmbio, possibilitando levar atenção dos residentes ao bioma de seu local de origem, onde sua pesquisa está localizada, assim como na interação com a comunidade local. Santídio Pereira e Fabrício Lopez apresentam no Base o projeto Cadê a Matriz? e participam de uma conversa com o mesmo título mediada pelo curador, professor e pesquisador José Augusto Ribeiro.
Thiago Honório atua como professor dos cursos de artes visuais na FAAP desde 2006, tendo ao longo destes anos também orientado dezenas de alunos em seus trabalhos de conclusão de curso de graduação e pós-graduação, sendo uma delas a artista Julia Gallo, sua ex-aluna e ex-orientanda, a qual ele convidou para colaborar neste projeto. Desde 2016 também co-dirige o Grupo de Orientação Artística (GOA) com a curadora Ana Paula Cohen, no qual durante um semestre, em encontros semanais, discutem e analisam o trabalho dos artistas participantes, textos e proposições selecionadas. Adepto da pedagogia engajada, Honório se guiou por princípios encontrados nos pensamentos de bell hooks, Paulo Freire e Sônia Salzstein, esta última sua orientadora em seu doutorado em Artes Visuais pela ECA/USP. O artista enxerga em seu percurso de docência, tanto ensinamento quanto aprendizado, citando Freire: “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”*. Thiago Honório e Julia Gallo apresentam no Base o projeto desenhodesejo e participam da conversa relicário mediada pelo terapeuta ayurveda Gil Kehl.
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Joseph Beuys foi um artista alemão, considerado um dos mais influentes do século XX, e também atuou como professor na Kunstakademie Düsseldorf durante 11 anos, da qual foi expulso por se recusar a aceitar os processos institucionalizados, tais como número máximo de alunos por turma e avaliação de portfólios. Na visão de Beuys todas as pessoas deveriam ter o direito de estudar. Ao aceitar 142 alunos, os quais previamente tinham sido rejeitados em outras classes, foi expulso da universidade, para a qual nunca retornou, mesmo após muitas petições de outros artistas, professores e estudantes pedindo sua volta. Muitos dizem que ele nunca deixou de ser um professor, mesmo longe da academia.
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FREIRE, Paulo. _Pedagogia da autonomia_. São Paulo: Paz e Terra, 1996, p. 23.
Programação
29.05, quinta- feira às 17h
Cadê a matriz?
Os artistas Santídio Pereira (Galeria Estação) e Fabrício Lopez (Galeria Marilia Razuk) conversam com o curador José Augusto Ribeiro.
30.05, sexta- feira às 17h
relicário
O artista Thiago Honório (Luisa Strina) e a artista Julia Gallo (Yehudi Hollander-Pappi) conversam com o terapeuta Āyurveda Gil Kehl.
31.05, sábado às 17h
Depois do Fim
A artista Dora Longo Bahia (Vermelho) e integrantes do grupo de pesquisa Depois do Fim da Arte conversam com o professor Gabriel F. Zacarias.
01.06, domingo às 15h
Mirando na esperança e tecendo amanhãs: Arte, formação e práticas comunitárias.
Os artistas Dalton Paula (Martins&Montero) e Genor Sales (Cerrado) conversam com a antropóloga Ana Paula Ribeiro.